O liberalismo é, de muitas
maneiras, um fruto do Iluminismo, movimento surgido no início do século 18 que
tinha em seu âmago uma revolta contra o poder da religião institucionalizada e
contra a religião em geral. As pressuposições filosóficas do movimento eram, em
primeiro lugar, o Racionalismo de Descartes, Spinoza e Leibniz, e o Empirismo
de Locke, Berkeley e Hume. Os efeitos combinados dessas duas filosofias — que,
mesmo sendo teoricamente contrárias entre si, concordavam que Deus tem de ficar
de fora do conhecimento humano — produziu profundo impacto na teologia cristã.
Como resultado da invasão do Racionalismo na teologia, chegou-se à conclusão de
que o “sobrenatural não invade a história”. A história passou a ser vista como
simplesmente uma relação natural de causas e efeitos. O conceito de que Deus se
revela ao homem e de que intervém e atua na história humana foram logo
excluídos. A fé cristã histórica sempre acreditou que os milagres bíblicos
realmente ocorreram como narrados. Milagres como o nascimento virginal de
Cristo, os milagres que o próprio Cristo realizou, sua ressurreição física
dentre os mortos, os milagres do Antigo e Novo Testamentos, de maneira geral,
são todos considerados fatos. O teólogo liberal, por sua vez, e os
neo-ortodoxos fazem distinção entre historie (história, fatos brutos)
e heilsgeschichte (história santa, ou história salvífica), criando
dois mundos distintos e não conectados: o mundo da história bruta, real,
factível e o mundo da fé, da história da salvação. Temas como criação, Adão,
queda, milagres, ressurreição, entre outros, pertencem à história salvífica e
não à história real e bruta. Para os liberais e os neo-ortodoxos, não interessa
o que realmente aconteceu no túmulo de Jesus no primeiro dia da semana, mas,
sim, a declaração dos discípulos de Jesus que diz que Jesus ressuscitou. Assim,
o que eles querem afirmar com isso é bastante diferente daquilo que a fé cristã
histórica acredita. Na verdade, eles consideram que os relatos bíblicos dos
milagres são invenções piedosas do povo judeu e dos primeiros cristãos, mitos e
lendas oriundos de uma época pré-científica, quando ainda não havia explicação
racional e lógica para o sobrenatural.
Autor: Augustus Nicodemus
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